O Amante, uma das peças mais brutais e íntimas de Harold Pinter, é o ponto de partida para a nova criação da Mákina de Cena, assinada por Carolina Santos, e interpretada por Marlene Barreto e José Leite.

Num mundo em que a exposição passou a ser permanente, também somos todos “voyeurs”: a vida dos outros, a privacidade dos outros interessa-nos, “é” da nossa conta, e sempre…sem sair de casa. O íntimo torna-se público, a verdade é muito menos interessante do que a mentira, e tudo é questionável.

Exploramos, neste Amante, a humanidade contida na sedução e no fingimento, numa encenação que parte do exterior para o interior, do visível aos olhos de todos – porque o espetador também será visto pelo espetador da frente, operando numa dimensão de estranheza e falso pudor, própria de quem sabe que as reações de todos estão a ser objeto de interesse.

A apresentação em espaço público, no coração da cidade – Cerca do Antigo Convento Espírito Santo, de uma obra desta natureza – quase erótica e propositadamente dissimulada, tem tanto de provocatório como de arriscado. Para além de descontextualizar o teatro do seu edifício, convoca outras dimensões da criação teatral, de índole alternativa e performativa, e com uma temática pouco explorada em “horário nobre”, abrindo espaços para a discussão franca sobre sexualidade.